quinta-feira, 15 de agosto de 2013

Dedo Na Garganta




No começo doeu, doeu no corpo e na alma. Um corpo quase vazio, quase sem alma. Machucou e pesou, pesou na consciência de quem precisava fazer isso de uma vez por todas, mas se envergonhava. Na verdade, tinha mais medo que vergonha. Medo de bater de frente com tudo que um dia lhe ensinaram. “Colocar tudo pra fora? Você está louca. Isso é doença, das graves. Tira esse dedo daí, menina.”

Foram segundos até que a primeira ânsia chegasse. Ela quase desistiu. Mas precisava. O dedo continuou ali. Mais uma vez a ânsia. E pronto, tudo pra fora. Tudo por água a abaixo. Tudo sendo como deveria ser, ou pelo menos como ela achava que deveria ser. Até que enfim ela percebeu que não tinha mais como levar aquele corpo pesado. Pesado de tanto carregar as dores da pequena alma, pesado de angústia consigo mesma, pesado de tanta tristeza.

De frente para o espelho com o rosto sendo lavado pelas lágrimas que lhe escorriam. O rosto também foi lavado por tudo que saiu. Tudo que mostrava o que ela havia engolido por tanto tempo, tinha mais sapo que brejo, mais mentira que jogo da verdade, mais choro que novela mexicana, tinha de tudo ali. Tudo que ela sempre engoliu. E se você olhasse bem, tinha até pedaços dela.

Não pedaços físicos, mas umas partes que ela escondeu pra se encaixar. Umas verdades que ela deveria ter dito, uns sorrisos que ela deveria ter dado, até umas lágrimas que ela deveria ter derramado. Tinha algumas frustrações e uns sonhos. Espera, uns não, tinham vários sonhos, sonhos aos montes, que foram engolidos para vestir o que a vida lhe dava. E a vida sempre lhe deu uma boa realidade tamanho 38, enquanto ela criava expectativas tamanho 44. Sempre se contentou. Era aquilo que a vida lhe dava, era aquilo que ela vestiria. Perdida, apertada, sufocada, enjoada, e até que enfim, cansada.

Cansou, ela finalmente cansou. Ela finalmente queria se adequar, se adequar a ela mesma e não aos padrões. Não queria emagrecer, queria embelezar, embelezar a vida. Não era para diminuir por fora, era para aumentar por dentro. Precisava colocar tudo pra fora, para se colocar para dentro.

Daqui pra frente?! Ela está de dieta, não engole o que não lhe agradar. Dedo na garganta e sorriso no rosto. Relaxa, é bulimia do bem. Não é pra caber na vida tamanho 38, é para caber nela mesma que sempre foi tamanho 44 e nunca tinha percebido. Para que caiba de volta no corpo, sua alma.




6 comentários:

  1. "tinha mais sapo que brejo, mais mentira que jogo da verdade, mais choro que novela mexicana, tinha de tudo ali...Umas verdades que ela deveria ter dito, uns sorrisos que ela deveria ter dado, até umas lágrimas que ela deveria ter derramado. Tinha algumas frustrações e uns sonhos"

    AFF, só amor por esse texto <3

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  2. Cansou, ela finalmente cansou. Ela finalmente queria se adequar, se adequar a ela mesma e não aos padrões. Não queria emagrecer, queria embelezar, embelezar a vida. Não era para diminuir por fora, era para aumentar por dentro. Precisava colocar tudo pra fora, para se colocar para dentro. *_*

    Daqui pra frente?! Ela está de dieta, não engole o que não lhe agradar. Dedo na garganta e sorriso no rosto. Relaxa, é bulimia do bem.
    +/- isso

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  3. por um momento, achei que ela tivesse anorexia..

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  4. Não era para diminuir por fora, era para aumentar por dentro. Precisava colocar tudo pra fora, para se colocar para dentro. Que texto... LINDO! Lindo, lindo mesmo! *-*

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Comentários

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